sábado, 26 de junho de 2010

Educação e Afecto (trabalho apresentado na Pós - Graduação em Educação Especial)

Resumo: Nos dias de hoje, o mundo é movido pelo capitalismo. Surge o grito de alerta para a importância dos afectos no desenvolvimento da criança. São vários os autores que defendem este ponto de vista, valorizando a interacção social e mormente as relações familiares. O maior exemplo de uma relação fulcral será talvez a relação entre o bebé e o seu cuidador (geralmente a mãe) – é a Relação de Vinculação.


Palavras – Chave: Afecto, Afectividade, Relações Familiares, Relação de Vinculação.


Abstract: Nowadays world is moved by capitalism. An alert cry is sounded about the importance of affection in child development. Many authors support this point of view, valuing social interaction and, above all, family bonds. The best example of such an important relationship is, maybe, the relationship between a baby and it’s caregiver (usually the mother) – which is called bonding.

Keywords: Affection, Affectivity, Family Bonds, Bonding.


Num mundo tecnológico como o de hoje cuja seiva é o capitalismo, os pais e a família em geral, são, por vezes, forçados a grandes ausências do lar. O relembrar que a personalidade da criança começa a ser formada desde cedo e que os primeiros anos de vida são essenciais na construção de toda a estrutura que sustentará este ser em desenvolvimento, são ideias que parecem incompatíveis (Behenck e Schneider, 2004).
Uma educação infantil sem amor e sem afecto leva a que se abram hiatos difíceis de fechar na idade adulta. Segundo Behenck e Schneider (2004), os educadores e professores deparam-se muitas vezes com dificuldades de aprendizagem da criança que têm origem em factores emocionais.
A existência de afectividade é essencial para fazer pessoas felizes.
A palavra afecto (unidade da afectividade) tem origem no latim affectur (afectar, tocar) é sinónimo de toque, aproximação, conexão. Sendo a aprendizagem uma interacção onde ocorrem trocas, não será possível que esta exista, efectivamente, sem afecto. Pode dizer-se que aprendizagem e afecto estão intimamente relacionados.
Mas como se definirá afectividade?
Capelatto (2002:8) define afectividade como “a dinâmica mais profunda e complexa de que o ser humano pode participar” Segundo o mesmo autor, a afectividade inicia-se quando se sente amor, amor este associado ao medo de perda. A afectividade é um conjunto de sentimentos. Quando se aprende a controlar o turbilhão de sentimentos, é possível ter uma vida emocional equilibrada. Por vezes, é necessário um cuidador que ajude a controlar as emoções. O cuidador deve saber impor limites com autoridade e não com autoritarismos. Aqui pode gerar-se frustração, mas, é com ela que se resolvem os conflitos e há aprendizagem (Capelatto, 2002).
Longhi et al (2007:6), citando Bercht (2001:59) define afectividade como “termo utilizado para identificar um conjunto de fenómenos psíquicos e físicos que incluem o domínio das emoções propriamente ditas, dos sentimentos das emoções, das experiencias sensíveis e, principalmente da capacidade de poder entrar em contacto com as sensações”.
São vários os autores que associam o afecto e as relações sociais ao desenvolvimento intelectual e de estruturas cognitivas e à aprendizagem. A afectividade (enquanto conceito abrangente) e as emoções (enquanto exteriorização da afectividade) são fulcrais para todo o desenvolvimento, incluindo o desenvolvimento cognitivo.
A verdadeira aprendizagem (olhando pelo prisma do construtivismo) é a aprendizagem significativa. A aprendizagem torna-se significativa à medida que o conhecimento ganha significado em relação aos conhecimentos prévios. Em termos gerais, pode-se dizer que as aprendizagens significativas não são esquecidas após a avaliação. (Pelizzari et al, 2001).
Segundo a Teoria de Ausubel, a aprendizagem significativa exige duas condições: predisposição para aprender (implica experiencia afectiva agradável) e conteúdos com significado lógico e psicológico (Santos, 2006).
Piaget considera que afectividade e cognição complementam-se, não podendo, por isso, ser separadas (Piaget, 1962).
Segundo Wallon (1971), o desenvolvimento começa por ser afectivo, sendo as emoções a principal forma de interacção com o meio. Posteriormente, o desenvolvimento faz-se por estádios onde, nuns predomina a afectividade, noutros a cognição.
Vygotsky considera que a afectividade e as relações sociais são fundamentais para o desenvolvimento humano. Ele fala numa zona de desenvolvimento proximal que corresponde à distância entre desenvolvimento actual (o que a criança faz sozinha) e desenvolvimento proximal o que é capaz de fazer com ajuda). Isto implica duas necessidades: possibilidade de desenvolvimento e mediação sociocultural. Assim, a aprendizagem faz-se contextualmente pela interacção com outros alunos, pais, professores, etc (Bertrand, 2001).
O neurologista português António Damásio escreve no seu livro “O Erro de Descartes” (que sem emoção e sentimentos não poderá haver racionalidade. Este facto foi amplamente estudado por exemplo com o caso Phineas Gage. Damásio contraria Descartes que ao dizer “Penso, logo existo” exclui a emoção (Damásio, 1995).
O primeiro e mais claro exemplo de relação afectiva é a relação de vinculação que o bebé estabelece, geralmente com a mãe. Esta relação é a ligação que se cria entre o bebé e o seu mais próximo cuidador, geralmente, a mãe. É esta figura de vinculação que dá segurança ao bebé para explorar o Mundo. A família, e muito particularmente a mãe (mais frequentemente) constitui o primeiro agente de socialização (Gleitman, 2002).
O bebé recém-nascido é capaz de comunicar, emitindo e recebendo mensagens e reconhecendo pessoas e coisas. É a sua marca humana (Montagner, 1993).
“A experiência relacional do bebé é caracterizada não só por um bebé com características emocionais mas também por alguém que dele cuida, que está emocionalmente disponível e que tem uma sensibilidade e responsividade emocional para com as pistas do bebé” (Emde, 1989:44-45).
Uma relação vinculativa de qualidade é fundamental para o desenvolvimento da criança a todos os níveis (Pimentel, 1997).
Só os laços fortes de amor, aceitação, carinho, empatia e respeito é que permitirão á criança tornar-se num adulto feliz e emocionalmente equilibrado, na medida em que a partilha destes valores pela família, condiciona as experiências da criança em desenvolvimento. Sem interacção mútua e complexa com várias pessoas, não se dará um conveniente desenvolvimento intelectual, emocional, social ou moral. Em suma, para que o desenvolvimento seja pleno deve haver envolvimento familiar e um meio estimulante (Gomes-Pedro, 2005).
Cabe aos técnicos, como por exemplo, a Intervenção Precoce, intervir na família para prevenir possíveis problemas, facilitando as ligações e a comunicação.
É preciso que toda a comunidade tenha uma organização que gire em torno do pleno desenvolvimento das nossas crianças. Ninguém pode ficar indiferente num Mundo que é tão grande mas, simultaneamente, tão pequeno. Apoiar a família e prevenir vivencias perturbadoras que culminem em desastres como o Bullying, o suicídio, as doenças mentas, entre outros, cabe a todos quantos lidam com as crianças, sejam eles técnicos (professores, educadores, médicos, enfermeiros), família, amigos, no fundo, toda uma comunidade (Montagner, 1993; Gomes – Pedro, 2005).


Bibliografia
• BEHENCK, Denise; SCHNEIDER, Ernani, Educação e Afecto – Uma ligação necessária, Revista de Divulgação Técnico – científica do ICPG, Vol. 2, Nº6, Julho – Setembro, 2004, disponível em
http://veterinariosnodiva.com.br/books/educacao-e-afeto.pdf, consultado a 23/04/2010 às 20:30.
• BERTRAND, Yves – Teorias Contemporâneas de Educação, Colecção Novos Horizontes Pedagógicos, nº 4, Lisboa, Instituto Piaget, 2001.
• CAPELATTO, Ivan, Educação com Afectividade, Colecção Jovem Voluntário, Escola Solidária, Editora Fundação Educar DPaschoal, 2002.
• DAMÁSIO, António – O Erro de Descartes: Emoção, Razão e Cérebro Humano, Mem – Martins, Fórum da Ciência, Publicações Europa – América, 1995.
• EMDE, R., The Infant´s relationship experience: developmental and affective aspects In. SAMEROFF, A.; EMDE, R. (Eds.) – Relationship and Disturbances in Early Childhood – A Developmental Approach, New York, Basic Books, 1989, págs. 33 – 51.
• GLEITMAN, Henry – Psicologia, 5ª Edição, Lisboa, Serviço de Educação e Bolsas, Fundação Calouste Gulbenkian, 2002.
• GOMES-PEDRO, João et al, A criança e a Família no século XXI, Lisboa, Dinalivro, 2005.
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http://www.cinted.ufrgs.br/ciclo10/artigos/3bMagali.pdf, consultado a
24/04/2010 às 12:33.
• MONTAGNER, Hubert – A Vinculação – A Aurora da Ternura, Colecção Epigénese de Desenvolvimento, nº 1, Lisboa, Instituto Piaget, 1993.
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• PIAGET, Jean – The relation of Affetivity to Inteligence in the mental development of the Child In Bulletin of the Menninger Clinic, vol. 26, nº 3, 1962.
• PIMENTEL, Júlia Van – Zeller de Serpa – Um Bebé Diferente: da Individualização da Interacção à Especificidade da Intervenção, Lisboa, Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração da Pessoa com Deficiência, 1997.
• SANTOS, Flávia, As Emoções nas Interacções e a Aprendizagem Significativa, Revisado, Rio Grande do Sul, Faculdade de Educação – Universidade Federal de Rio Grande do Sul, 2006, disponível em
http://www.portal.fae.ufmg.br/seer/index.php/ensaio/article/viewFile/127/177, consultado a 24/04/2010 às 12:45.
• WALLON, H. – As origens do carácter na criança: os prelúdios do sentimento de personalidade. São Paulo, Difusão Europeia do Livro, 1971.